sábado, 13 de julho de 2013

A Majestade

*Por Thiago Augusto Pestana da Costa

Com intenção de trocar a História tradicional e sua narrativa de guerras, e dentre outros assuntos, uma ênfase política, surge a História problema que rompe o desfile de datas e nomes maçantes visando ao avanço acadêmico, abrindo o diálogo com todas as demais disciplinas humanísticas, na formação da escola historiográfica francesa inaugurada com a fundação da revista dos Annales, criada em 1929 por Lucien Febvre, um historiador modernista, com afeição por Geografia histórica, e o historiador medievalista Marc Bloch, que se identificava com a Sociologia bastante influenciado por  Émile Durkheim.
A sensibilidade e a rigidez metodológica não se opõem, misturam-se na construção de um trono onde a majestade História toma posse para reinar na interdisciplinaridade com magnitude e louvor. Estava formada a primeira geração dos Annales.
No pós-guerra, o historiador Fernand Braudel assume a liderança do movimento, o que marca a denominada segunda geração dos Annales. Com a morte de Bloch e Febvre, Braudel assume a direção da revista,  e manteve em linhas gerais as concepções de História dos fundadores, almejando a construção de uma História total,  além de  manifestar profundo interesse pela geo-história, campo no qual desenvolveu sua tese “O Mediterrâneo de Felipe II”, obra manuscrita de memória, no período em que esteve preso durante a guerra.
Braudel também fez cravar seu nome na historiografia mundial com sua sistematização das diferentes temporalidades do tempo histórico: a curta, média e longa duração. Muitos estudantes e pesquisadores foram influenciados por Braudel, que recrutava novos talentos historiográficos que formariam a terceira geração dos Annales, a exemplo do medievalista Jacques Le Goff, de Marc Ferro e Pierre Nora, além do destacado Le Roy Ladurie que sucedera Braudel no Collège de France. A terceira geração fez desenvolver a perspectiva da micro-história, com o clássico “Montaillou” de Le Roy Laduerie, e também  trabalhava a História quantitativa, com Ernest Labrousse e outros economistas, que abrem janelas para marxismo dialogar com os trabalhos dos Annales.
Um grande marco desta geração é a conquista do espaço das mulheres na História, como demonstram dos trabalhos de  Klapish, Farge, Michèlle Perrot, esta última,  escreve sobre a história do trabalho e juntamente com  Georges Duby organiza obra de cinco volumes sobre a história da mulheres no Ocidente. Philippe Áries chama a atenção do público com sua  história da infância, na perspectiva da história cultural e do cotidiano, Foucault redireciona a política para a micro-política.
Na virada do século, emerge a Nova História Cultural, e com ela torna-se patente a influência da Antropologia no trabalho do historiador, sobretudo o olhar para o passado como o “outro”, e a problematização teórica em torno nas noções de cultura.
         Desde Braudel, a História vem ostentado o título de rainha das disciplinas, envolve-se em uma filosofia contemporânea, pós-moderna e decorrente crítica ao Iluminismo. Cultura é linguagem. O método de Geertz, a descrição densa; Bakhtin, e a teoria da cultura visual; Norbert Elias, e a civilização como arte da vida cotidiana; Foucault, e noção de estrutura micro-física do poder,  e não mais apenas o poder  ligado ao Estado e à economia; Pierre Bourdieu, a noção de “habitus” como esquemas de pensamento e ação adquiridos em um campo específico onde o sujeito está inserido; Michel de Certeau e sua contribuição para as “teorias da recepção”, que estudam as diferentes reações do que foi assistido ou lido,  não mais algo visto como uma operação passiva, e sim ativa.
         A velha ideia de uma História total impulsiona a Nova História, pelo engajamento nas mais diversas teorias, o que ocasionou certo risco de fragmentação. O historiador vai ao passado com a visão e os recursos contemporâneos para fortalecer suas raízes e preservar a sua integridade, sua majestade.


*Thiago Augusto Pestana da Costa é estudante do 2º semestre de História, esse texto foi redigido como forma de avaliação final da disciplina Estudos Históricos, do 1º semestre de 2013.